sábado, 24 de maio de 2014

Poder Local democrático: algumas questões

No passado dia 20 de maio (no mesmo dia que a cidade de Vendas Novas completou 21 anos) assinalaram-se os 30 anos da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP). A este propósito, e considerando que os 40 anos sobre a Revolução de Abril também se comemoram durante 2014, pareceu-me de todo conveniente fazer algumas referências sobre aspectos muito importantes para o Poder Local democrático:

Nos últimos anos, em particular depois do inicio da chamada crise financeira das dividas soberanas, algumas vozes se levantaram contra o Poder Local e os seus autarcas. Houve até quem rapidamente levantasse a suspeita da chegada de mais uma desgraça, com mais um buraco financeiro provocado pela divida "escondida" das autarquias, à semelhança do que já acontecia na Região Autónoma da Madeira. Alguns desses estão hoje confortavelmente sentados na cadeira do Poder Local! Pois é, mas o Poder Local no seu global (e é assim que deve ser sempre visto) foi e continua a ser gerador de superavit e, seguramente, não lhe podem ser assacadas responsabilidades pelos consecutivos deficits financeiros das administrações públicas. Todos sabemos que nas autarquias locais existem problemas, quer ao nível financeiro de algumas, quer na corrupção, quer nos "facilitismos", quer até ao nível de aspectos de funcionamento e transparência da vida política autárquica. Mas não há dúvida, que mesmo existindo problemas, este é o Poder em Portugal que com maior eficácia responde por menos aos problemas e anseios das populações e, que mais e melhor é fiscalizado, quer pelas instituições, quer pelas populações. E os autarcas são os únicos políticos que de forma clara podem ser responsabilizados financeiramente pelos seus actos. Dito isto, relembro que o Poder Local democrático emergido do 25 de Abril de 1974 e consagrado na Constituição da República Portuguesa de 1976 é um dos pilares fundamentais da nossa democracia, que naturalmente deve evoluir, mas que não deve ser desvirtuado nos seus aspectos essenciais, como infelizmente tem vindo a acontecer, designadamente desde 2006.
Aliás, se olharmos para os últimos 200 anos da História de Portugal, e particularmente para a evolução do Poder Local, seguramente com facilidade chegaremos à conclusão que foi nos últimos 40 anos que as autarquias locais conheceram o seu período de maior estabilidade e, ao mesmo tempo, de maior prosperidade. De facto, depois das várias reformas que o século XIX conheceu, num movimento pendular mas de diminuição do poder local, depois do romantismo da I República e do ataque do Estado Novo com a redução dos municípios e das freguesias a meros organismos desconcentrados do Estado é, com o 25 de Abril, e com a Constituição de 76 que as autarquias locais adquirem o seu estatuto de maior perfeição, ou seja, passaram a ser verdadeiras instituições de Poder Local, eleitas democraticamente e com atribuições e competências mais amplas e de maior responsabilidade.
Perante a descaracterização do Poder Local democrático a que temos assistido nestes últimos anos, perante a redução do nº de Freguesias, de novas (!) Leis da Finanças Locais e do novo (!) Regime das Autarquias, é caso para temermos o pior. Sabemos que no passado, a importância e significado do Poder Local foi reduzida e que no futuro pode acontecer o mesmo. O exemplo da dita reforma das Freguesias é paradigmático: apresentada como uma importante reforma resultou num fracasso que nada de positivo trouxe às populações, nem eficiência, nem a tão esperada redução de custos, apenas mais trapalhadas. Com é certo e sabido, as consequências de menos Poder Local é sempre nefasto para as populações, pois afasta os centros de decisão e aumenta a desigualdade territorial. Cabe definitivamente aos actuais autarcas do país olharem de forma séria para o que temos e que queremos ter e dar uma resposta firme, todos os dias, na defesa dos valores fundamentais do Poder Local democrático.

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